sexta-feira, 13 de março de 2009

Ponto De Vista

ponto de vista de
Fernando Aidar


1. Em primeiro lugar, vamos falar sobre o contexto mundial. Está havendo uma grande mudança no mundo da moda?

A moda está cada vez mais globalizada. Não existem mais barreiras. Por exemplo, um grande criador apresenta um desfile. Depois de alguns dias as fotos já estão nas revistas, as pessoas conseguem acessar o site e isso é rapidamente massificado também paras as camadas b, c e d da sociedade. A informação está disponível para todo mundo e com muita rapidez. Mas isso não acabou com alta costura. A alta costura continua vendendo sim. Algumas griffes caíram em vendas, mas outras subiram com algumas fusões. Inclusive algumas entrando para o mercado de ações também, fato que já vem acontecendo nos dois últimos anos.

A moda hoje é um grande negócio. Não adianta você ter luxo, glamour e sofisticação se você não gera dinheiro. Está havendo troca de estilistas e um grande intercâmbio entre os estilistas novos que estão assumindo as maisons. Mas, se você me perguntar se está havendo uma crise mundial é difícil responder a isso, porque os números nunca são divulgados com tanta precisão. Não podemos nos esquecer de que a indústria de cosméticos e perfumes é muito importante e ajuda a sustentar a alta costura.

2. De que maneira essas mudanças afetam a moda brasileira?

A moda estando disponível também para as camadas mais populares, obviamente que a capacidade de modificação e de criação em cima disso tem de ser mais rápida. O Brasil tem um ponto positivo, porque nós conseguimos nos adaptar, mudar e criar em cima destas outras griffes muito rapidamente. A imprensa internacional hoje em dia fica de olho no Brasil pela criatividade do brasileiro e pela capacidade dele de misturar tudo o que acontece no Oriente, na Europa, nos Estados Unidos e adaptar ao nosso clima.

O sobe e desce das grandes griffes mundiais não afeta o Brasil. O que é preciso ficar bem de olho, e isto é positivo, são nas redes ou marcas famosas que estão chegando, cada vez mais. O dólar alto faz com que haja esta injeção de capital estrangeiro no país. Estas empresas vindo pra cá, vão acabar comprando do mercado nacional, devido à modelagem, devido ao preço e ao gosto do brasileiro também. E é claro, isto vai fazer com que o próprio mercado nacional se mexa mais, pesquise mais, para trabalhar de igual para igual com elas.

3. Na sua opinião, quais são os pólos de moda hoje no Brasil?

São Paulo, o sul, o pólo de Goiânia que deu um salto enorme, entre outros. Minas é um pólo tradicional que está se reestruturando com as associações e a organização em grupos.

4. Em termos de moda mineira, como você está vendo este ressurgimento através das associações?

Eu falo não só em termos de Minas Gerais, mas no Brasil inteiro. Eu acho que é a melhor forma realmente das regiões se organizarem, porque existem produtos típicos, exclusivos em cada região. Minas é conhecida pelos trabalhos artesanais, bordado, as peças diferenciadas. Uma coisa que você não encontra em São Paulo. Na região do Nordeste, todo mundo vai atrás das rendas, das rendeiras de Aracati, que é um outro tipo de trabalho manual. A forma justamente das confecções conseguirem viabilizar a participação em feiras, pesquisa, aquisição de informação é se organizando em grupos. A informação está disponível para todos. O negócio é cada um querer trabalhar esta informação de uma maneira diferente.

5. Como você vê este trabalho que está fazendo com o Minas Mostra Moda? Há quanto tempo você está e qual a sua impressão deste trabalho?

Com o Minas Mostra Moda, vamos partir para o segundo ano de trabalho. Está sendo muito gratificante, porque acabamos aprendendo também. São mais de 50 empresas participantes, cada uma fazendo um tipo de trabalho específico. É bom ver as necessidades deles para pesquisar lá fora e tentar trazer coisas que possam interessar cada uma delas. É uma troca. Não estamos aqui só para ensinar. Eu viajo oito vezes por ano para fora. Eu venho para passar o que os meus olhos viram, para captar o que eles estão precisando e para daqui a um mês e meio, dois, voltar e oferecer estas e outras informações.

6. Como você vê esta organização do Grupo Minas Mostra Moda e esta iniciativa de se lançar agora uma revista?

Eu acho que mostra cada vez mais um fortalecimento e solidificação desta parceria entre as confecções. Principalmente em termos de viabilidade, de pesquisa, de criação. Nós só temos que ver o lado positivo disso, porque, hoje em dia, é preciso se unir para comprar matéria-prima, insumos, aviamentos. É necessário baratear custos e não adianta você ser único na região. Você tem que ter justamente a região toda forte para ela se mostrar como pólo no Brasil.

7. Quais são as tendências para o inverno 2003? O que pode ser adaptado para o Brasil?

Não podemos deixar de falar da influência romântica. Mas esta influência romântica, de babados, flores e delicadezas, pode ser misturada também, por exemplo, ao folclore russo. Ela pode ser misturada a outros folclores e partir para a etnia. Temos também a viagem que vai pelos países do Marrocos, Índia e países orientais. Nós temos influência da Espanha, a influência Latina que ainda continua e temos também a influência do militar, a influência do uniforme. Não é a roupa do soldado. É uma roupa uniforme, que pode ser uniforme dos anos 50, uniforme militar, pode ter as duas caras.

Partindo daí nós temos também a tendência ao gótico, que segue um pouco do dark, dos anos 80. Mas ao mesmo tempo ele é romântico, é nostálgico. Na verdade, o que podemos constar é uma mistura muito grande de influências. É possível ter quatro, cinco influências em uma mesma peça: o romântico, o oriental, o romântico-gótico, o militar-gótico. É no cruzamento destes direcionamentos da moda, destes temas é que se verifica justamente esta história da globalização. É o trabalho de você decodificar um look. Quando você olha numa revista, você vê vários elementos diferentes na mesma peça.

8. O que pode ser aproveitado no Brasil para o próximo inverno, na sua opinião?

Um fato positivo até especialmente para a moda mineira é a presença de muito trabalho manual. Hoje em dia as peças tem de ser trabalhadas. Os trabalhos manuais de bordado, de sobreposição. Tem muito isso lá fora. É aquela questão de customização das peças que é uma coisa característica de Minas. Este trabalho todo manual de customização de peças, é que vem forte por aí, como diferencial.

9. Na moda mineira, o que chama a sua atenção?

É justamente esta facilidade com que os mineiros têm de fazer trabalhos complicados. Trabalhos manuais que outras regiões do Brasil não conseguem fazer. Aqui em Minas você consegue ver vários trabalhos complicados em um mesma peça. E produzida em quantidade.

10. Você é consultor há quanto tempo?

Eu trabalho com consultoria há seis anos e tenho a minha empresa há quatro anos e meio. É uma empresa que fica no Brasil e nos Estados Unidos. Assim, eu vou viajando e trazendo as informações para o mercado nacional.

11. Quem você atende além do Minas Mostra Moda no Brasil e no exterior?

Eu viajo para o exterior para dar palestras sobre tendências. Países como Colômbia, Peru, México. Eu atendo uma importadora de tecidos, estamparias, aviamentos e componentes metálicos. Também atendo a colônia coreana em São Paulo e várias empresas isoladas no Brasil. São vários clientes com produtos e realidades diferentes.

12. Depois de todo este tempo como consultor, agora você acaba de inaugurar sua própria loja, sua própria confecção. Como é isso?

Agora é o momento de sofrermos as críticas também. Percebi uma oportunidade de mercado, em uma região nobre em São Paulo, onde estão as grandes marcas e havia um ponto disponível. Em dois meses eu consegui alugar este ponto, reformar, registrar uma marca, criar uma coleção e inaugurar. Agora é que vamos começar a ter aquele medo que todo lojista tem. Coisas como “loja de rua em dia de chuva não vende”. Mas aquela região específica é uma região de público A. Obviamente precisamos fazer um bom trabalho. Vai levar um tempo para esta loja chegar à maturidade. Dá aquele frio na barriga. Você analisa a coleção dos outros. Agora não. É hora do público analisar a coleção que Fernando Aidar desenvolveu. Mas eu acho que é uma outra etapa, outra experiência. Eu continuo com os trabalhos de consultoria e aproveito as viagens e pesquisas que faço para usar também na criação da minha coleção. Eu não tenho medo de segurar a informação. Eu acho que é uma troca. Na palestra que eu dei hoje, eu falei o que estou fazendo nas minhas peças e dei como dica. Se as pessoas quiserem ou não aí cabe a elas. Mas a fonte, as idéia é a mesma.

13. Qual é o seu conselho aos estilistas?

Muito trabalho e não ter medo de fazer coisas diferentes. Aquela sensação de que já fiz de tudo, esta sensação existe, mas no fundo tem muita coisa que não fizemos e não sabemos. É preciso pesquisar em lugares onde você não está acostumado a pesquisar. Seja de madrugada, na televisão, em uma biblioteca, em um museu e uma galeria. A moda e o comportamento são componentes de um eterno aprendizado. Por isso, temos que nos aprimorar e ter vontade de aprender cada vez mais para criar.

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